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quarta-feira, 26 de abril de 2017

Muito mais que 13 motivos

Ontem terminei de assistir a série que está no Netflix chamada "13 Reasons Why".

A série, me causou um misto de sensações contraditórias, um passeio ziguezagueante que ia de indignação, passando por raiva, desprezo, decepção, compaixão, e chegando em preocupação real.

É engraçado quando uma simples série de TV consegue ir muito além de apenas entreter e divertir, aliás, de divertido essa série teve muito pouco ou quase nada. Desta vez, uma série de TV cumpriu, ao menos na minha forma de entender as coisas, um papel didático de alerta.

Para quem ainda não assistiu, uma garota de 17 anos, incapaz de administrar as complexidades emocionais de sua adolescência termina tomando a atitude mais drástica possível, dando cabo de sua própria vida.

Em vários momentos eu tentei traçar um paralelo entre tudo aquilo que eu via em minha vida durante a adolescência, na escola. A verdade é que me descobri aliviado, pois aquilo não aconteceu comigo, ao menos não daquela forma e muito menos naquele nível. Para ser sincero, fui um cara privilegiado, tanto que por incrível que pareça, constatar isso em alguns momentos, até me causa certo embaraço.

Fui privilegiado porque eu não posso afirmar que fui vítima séria de bullying, embora tenham havido vários momentos em que as coisas caminharam nessa direção. Houveram sim meninos e até meninas que me olharam como um possível alvo para suas “maldades”, mas acho que terminei me protegendo em um escudo de situação inversa. Não que eu tenha revertido a situação me transformando em um "bully" no sentido verdadeiro da palavra e fazendo o que eu tinha medo que fizessem comigo, escolhendo alvos frágeis para maltrata-los sistematicamente como é infelizmente comum acontecer. Não, não cheguei a agir assim.

Acho sim que meu privilégio foi ter recebido uma educação que, por mais que os métodos não tenham sido exatamente um exemplo de retidão política, me ensinou a me proteger. Eu então, tomei as rédeas da auto confiança e parti para uma jornada segura que consistia em resolver os problemas de forma rápida e ágil. Talvez quem olhasse de fora dissesse: “onde vai esse doido?”, mas dentro de mim, eu era indestrutível. Essa auto opinião, é claro, me causou alguns problemas e entre eles, uma certa dificuldade em manter relacionamentos ou estabilidade no trabalho, coisas que só fui aprender a administrar bem mais tarde. A vida então, se encarregou de me maltratar de outras formas, já que os colegas do colegial não conseguiam dar conta do “Super-Silvio”.

Mas então volto à 13 Reasons Why, onde Hanna, com seus 17 anos, não consegue lidar com o mundo louco ao seu redor. Temos bullying, amores frustrados e até estupro e é claro, suicídio. A entrevista com os produtores ao final da temporada explica que os adolescentes ainda não possuem seu ‘lobo frontal’ plenamente desenvolvido e por isto, encontram uma dificuldade especial em lidar com suas emoções – a “aborrescência” que tanto dizem, é um problema fisiológico e não apenas social. Diante da sensação de que seus problemas perdurassem "para sempre", sua decisão é uma atitude drástica que termina destruindo a si e é claro, atingindo de forma contundente, muita gente ao seu redor.

Eu como pai, apavoro-me. Se em vários momentos da série eu pensava “como pode Hanna ser tão boba, tão ingênua, tão cheia de auto piedade, tão fraca?” Em outros eu pensava que provavelmente aquilo tudo era só um retrato exagerado, uma crítica caricatural de uma sociedade norte-americana que está longe de ter um paralelo com os mano e as mina brasileira. Será que eu me enganei? Não sei, mas não quero testar essa possibilidade em casa. A série é pesada, mas necessária como alerta da necessidade de nos prevenirmos contra a mais remota destas possibilidades, afinal suponho que uma tragédia como essa, acontece de forma mais ou menos imprevisível por parte da maioria dos pais, parentes e amigos dos adolescentes. A sensação de segurança, evidenciada pelas boas notas na escola, pelo crédito nas habilidades emocionais e até mesmo pela nossa própria arrogância que pode nos julgar como pais protegidos contra “esse tipo de bobagem”, pode terminar nos pegando de surpresa diante da fragilidade emocional, social e fisiológica de nossos filhos vagando pelos meandros da fase pré-adulta.

Na série, Hanna é uma moça linda, inteligente. Seus pais são presentes, são compreensivos, são boa gente. Como é possível acontecer isso então? A sensação de que seus problemas durarão para sempre, que pode ser entendida como uma persistência imediatista povoa os pensamentos de Hanna. Ela perde sua identidade e sua humanidade numa mescla de autocrítica e autocomiseração. Uma permanente sensação de "estar sobrando". Tudo isso em meio a um ambiente com uma aparência (apenas isso) saudável. Esse é o paradoxo dos filhos.

Comigo deu certo, meus pais me ensinaram a revidar qualquer porrada direto na orelha de quem pensasse em dar a primeira, e embora seja grato, hoje não concordo com essa abordagem, porque aquilo que funcionou comigo, não irá necessariamente funcionar com meus filhos como um simples manual de instruções. Eu tive a sorte de me encaixar num perfil psicológico capaz de me proporcionar proteção, mas não posso tomar isso como certo para todos. É preciso ir além, oferecendo apoio verdadeiro e compreensão, respeitando o tempo e as diferenças entre meu eu-adulto e nossos filhos adolescentes, seres completamente diferentes, vivendo em tempos diferentes, com meios sociais diferentes, com posições subjetivas completamente diferentes diante dos problemas, das dificuldades e dos imprevistos que a vida nos apresenta.


Sivuca

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

É fácil perder o controle

Ontem assisti o filme Control, feito em 2007, sobre a vida do vocalista da banda Joy Division, Ian Curtis.
Foi uma dica de meu amigo Kiko, já que quando voltávamos da viagem para a Ilha do Cardoso, conversávamos a respeito de várias bandas e entre elas, algumas coisas do glitter Rock, de David Bowie, do Bauhaus, etc.
Particularmente fui fã do Joy Division, que para quem não sabe, mais tarde, após a morte do vocalista Ian Curtis, transformar-se-ia na conhecida New Order, famosa por várias músicas e entre elas Blue Monday.
O New Order deixou para trás toda a depressão que matou Ian Curtis, o New Order tinha de ser bastante diferente, pra cima, mas não há como deixar passar despercebido o som do Joy Division com suas letras tristes mas contundentes.
Mas o que mais me chamou a atenção no filme foi mesmo a descrição da história de um garoto (Curtis se matou enforcado em sua casa aos 23 anos) criativo, realmente genial, que encontra lugar para expressar sua poesia numa banda de rock feita de outros caras tão (ou mais) garotos que ele, explode rapidamente nas paradas de sucesso e começa a exigir de Curtis algo que segundo ele "não é capaz de atender".
O clima cinzento inglês vai além das paredes das casas retratadas na fotografia P&B do filme, ele está presente no humor das pessoas, na empresa onde Curtis trabalha, nos amigos, nos bares, na sua esposa e em tudo mais. Deve ser duro crescer num ambiente que sugere a introspecção e a tristeza dessa forma... que bom que somos brasileiros e aqui tudo é um pouco mais "colorido".
Curtis está vivendo o final da adolescência, é apenas garoto e como tal, encontra uma dificuldade tremenda em lidar com o mundo que o cerca. Ele está como ele mesmo diz, "fora de controle". 
Ele quer ser feliz, mas sua falta de experiência não permite que ele seja capaz de analisar esse mundo mais que apenas superficialmente. Toma decisões baseadas apenas no sentimento, louváveis, mas duvidosas, como propor sua namorada em casamento e logo depois ter um filho. Claro que ela acha tudo lindo e entra na dele, mas logo mais as exigências do estrelato, amargamente temperadas com a descoberta de uma epilepsia, a rotina do casamento e um caso com uma outra garota, vão transformando a vida de Curtis em um caos sem solução.
A letra da sua música mais famosa "Love will tear us apart" dá uma ideia do que ele só é capaz de expressar na poesia de suas músicas, já que quando é cobrado pessoalmente, não consegue ir além do silêncio:
"Quando a rotina corrói duramente e as ambições são pequenas
E o ressentimento voa alto, mas as emoções não crescerão
E vamos mudando nossos caminhos pegando estradas diferentes
Então o amor, o amor vai nos separar de novo".
Quando eu tinha minha banda, há quase vinte anos atrás e adorava o Joy Division, era um pouco parecido com Ian, não era capaz de ver as coisas em profundidade e provavelmente errava tanto quanto ele especialmente quando era necessário tomar uma decisão, especialmente se era uma decisão que envolvesse o futuro, algo tão incerto para quem tem 18, 19, 20 e poucos anos... Espero que os jovens que me são caros (e todos os outros) tenham um pouco mais de paciência com a vida, espero que saibam olhar os revezes de estar vivos, como um mero contraponto ao quanto é maravilhoso estar vivo.

Quando eu trabalhava no navio

Sem saber, entrei naquela enfermaria da UTI pela última vez. Percorri o corredor iluminado com aquele branco intenso, quase antisséptico, e ...